Calendário

No início do mês, chegou. Chegou e ficou. Acomodou-se rápido, tirou os sapatos, arrancou os pares de meias cinzas e jogou longe. Endureceram como pedra na segunda semana, sujas, encardidas, fedorentas de suor. Suor do pior tipo, do nervoso, da ansiedade, da vontade de se mexer.
A terceira semana foi a mais longa. Longa mesmo, daquelas em que se perde a noção de onde se está e quanto tempo passou. O relógio parecia até sofrer para realizar seus pequenos movimentos, era como se sua alma chorasse baixinho, pedindo ajuda pra continuar girando e girando e girando. Identificava-se com isso. Sentia o estômago embrulhar, não sabia o motivo. Era só a necessidade de gente misturada com a vontade de ficar sozinho, aquela coisa de querer se jogar em braços conhecidos misturada com aquela coisa de mergulhar sem destino dentro de si mesmo. Chorou, chorou sim, no começo chorou baixinho, virado de lado no sofá, as pernas dobradas, contemplava a cortina escura que tapava qualquer claridade que ousasse ultrapassar sua janela. Continuou assim, chorando baixinho e no escuro, lágrimas densas, quentes, rápidas como a vontade de fugir dali. Já não chorava tão baixo, encolhia-se, soluçava, engolia seco, tentava gritar...
Ninguém ouvia, mas esse também não era seu desejo. A terceira semana foi embora.
O fim do mês chegou. Foi chegando e ficando enquanto ele ia embora. Fim. Chegou. Chega.

sábado, 26 de abril de 2014

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